UM DESENHO POR SEMANA

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Soterrados - Uma história real


(continua a trilha) Em slow surge o rosto da esposa. Corta para rosto do filho. Começam os flashs dos fotógrafos. Vai para imagem do rosto de um dos homens apreensivos com as condições do que vai sair do buraco.


(sobe o ritmo da trilha triunfante) Imagem da cápsula aparecendo. Volta para imagem da mãe e filho arregalando os olhos com emoção contida, mas pronta para extravasar. Close no rosto da jornalista americana que acompanhou todo o drama das famílias e fez tudo para humanizar o processo, denunciou o aproveitamento político da situação e a situação de trabalho que os mineiros enfrentam no dia a dia.


(cessa a trilha) Buraco por onde estão passando os cabos. Surge a parte superior da cápsula com a qual cada um dos mineiros será salvo.


(aumenta o barulho da máquina puxando a cápsula tudo em slow) Começa a aparecer o rosto do  primeiro salvo.


(Volta a trilha em seu ápice) O homem que deixa escapar uma lágrima, por baixo dos óculos escuros que o protegem da luz. Seu rosto está magro e barbado.


Depois de  totalmente içado, o primeiro resgatado é libertado da cápsula e em um abraço emocionado, gira seu filho no ar  e dá um beijo apaixonado em sua esposa que em lágrimas sorri radiante. Todos ao redor estão aplaudindo. O casal para de se beijar. O mineiro fala olhando para sua mulher “ainda bem que eu te avisei que ia me atrasar para o jantar"


(Sobe a música) Plano geral visto de cima. Entram os créditos.

Não foi isso que você viu nos resgates, nem eu.

Inúmeros comentários surgiram pelas redes sociais nas horas  que se sucederam ao primeiro resgate.  Todos se relacionavam com uma certa decepção e um tom de crítica a essa exposição, com relação ao estado dos mineiros e de suas reações.

"Desconfio que tenham mandado Prestobarba pelo caninho... saem todos de barba feita!" (Tatiane Garcia)

Confesso que  por uns 2 ou 3 segundos eu mesmo fiquei um pouco decepcionado com a reação do mineiro ao encontrar a família. Depois passou e foi aí que eu comecei a refletir. O fato de vermos na TV ou pela internet ao vivo, não quer dizer que aquilo era um show, mas  a gente fica com esse conceito na cabeça. E aqui nem vai aquela crítica básica à mídia, manipulação ou coisa que o valha. Vai sim a ressalva a nossa expectativa individual. Do porquê acompanhamos as coisas, porquê clicamos em um link ou paramos num canal de TV enquanto estamos zapeando. Preocupação ou espetáculo?

Se você está lendo este texto certamente é como eu, capacitado a discernir sobre as coisas e não culpar a mídia por tudo.

Depois dos três segundos, dei graças a Deus pelo resgate deles e por não haver tragédia. E pensei "tomara que no desastre nosso de todos os dias eu haja, seja em palavras, seja em ações, e deixe o entretenimento e o ingresso para a sessão de cinema".

Ah, por falar nisso, Gael Garcia Bernau faz o mineiro e Penelope Cruz a mulher dele.


 

3 comentários:

  1. Além de pensar no filme sobre o resgate, fiquei a imaginar se no Brasil os mineiros fariam primeiro os exames ou dariam uma exclusiva para a Fátima Bernardes.

    Piquet diz que o momento mais esperado em uma corrida, é a largada, pois as chances de uma batida são maiores. Às vezes, não queremos espetáculo, queremos um Coliseu.

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  2. Em toda a bizarrice de inversão dos valores desse caso dos mineiros (muito bem retratada no texto por sinal) eu fico tentando fazer uma lista mental das coisas que são realmente sérias no mundo hoje em dia. Chego a conclusão que daria pra contar nos dedos das mãos do Lula eu acho. Tudo é superficial, efêmero.

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  3. concordo...não podemos banalizar os acontecimentos sociais em troca de espetáculos televisionados.

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