Já diria o filósofo (sempre quis começar um texto assim) Kierkegaard
que liberdade é escolher fazer aquilo que é certo. Ok, esse “certo” é outro
conceito em si amplamente discutível, mas hoje há em voga uma liberdade
opressora que obriga e que não oferece escolha alguma.
Liberdade sem
escolhas, hein?
Escondida sob a frase “o mundo está muito chato” que eu confesso, já usei,
essa liberdade ditatorial obriga a que você goste, ou no mínimo aceite como
relevante qualquer coisa. Traumatizados por mais de 40 anos de ditadura,
mencionar que alguém não deveria dizer algo, já nos dá arrepio, lembramos
imediatamente da censura e seus nefastos efeitos. Aí a liberdade perde sua
principal característica e manda que nos calemos.
Esse texto está na minha cabeça há vários meses, mas foram
os acontecimentos (posso chamar assim?) das últimas semanas com o jornalista e
humorista Rafinha Bastos que me empurraram definitivamente a redigir esse post.
Não entrarei no mérito do que foi dito por ele, mas da defesa que os colegas de
profissão, corporativamente andam fazendo.
Há entre os humoristas, comediantes, ou seja, qual for o nome, um senso comum que diz que humor (auto)controlado não é humor, que humor é essencialmente ofensivo e etc. Essa definição isenta o agressor, quer dizer, humorista de qualquer responsabilidade com o que se diz. Isso também acontece com a classe jornalística, o chamado quarto poder.
É como ser deputado e ter imunidade parlamentar, mesmo sendo suspeito de assassinato.
Eis que de repente os fins justificam os meios e eles podem dizer o que quiserem, pois se for com intuito de fazer rir, está liberado. E para eles quem achar ruim ou se manifestar contra, está sendo reacionário, a favor da censura ou simplesmente chato. É a ditadura da liberdade. Sobe o poder midiático/artístico à cabeça e aparecem os Hugos Chávez do humor.Como um dia escrevi aqui, na verdade todo mundo tem um ditadorzinho na barriga. Gostamos da liberdade que nos assiste e não dá que serve ao outro. Eu posso fazer o que eu quero e, perdão pela expressão, dane-se o outro. Cidadania zero, como alguém que depreda ônibus, passa trote no corpo de bombeiros ou rouba dinheiro da previdência. Para mim é a mesma coisa, em todos os casos ignora-se a necessidade do outro, o que ele precisa ou o que ele sente. Pra quê, né? Bóra fazer piada.
A culpa é do
politicamente correto?
Não nego que o politicamente correto invadiu a sociedade de tal forma que algumas vezes temos mesmo medo de dizer qualquer coisa e ofender determinado grupo, seja ele étnico, partidário, religioso etecetera e reticências e isso deixa mesmo o clima chato para brincar, escrever e até respirar.
Não nego que o politicamente correto invadiu a sociedade de tal forma que algumas vezes temos mesmo medo de dizer qualquer coisa e ofender determinado grupo, seja ele étnico, partidário, religioso etecetera e reticências e isso deixa mesmo o clima chato para brincar, escrever e até respirar.
Mas o fato de existir o politicamente correto não quer dizer
que devamos esquecer qualquer tipo de filtro só para tentar derrotá-lo. É a
mesma coisa que não pagar imposto pelo fato de ver no jornal escândalos de desvio
de verba. Um erro não justifica o outro.
A culpa é do Ronaldo?
A culpa é do Ronaldo?
Estava terminando este texto quando li outra barbaridade para justificar a
postura de desprezo pelo outro do caso do Rafinha Bastos. Que a turba acontecia
pelo fato de alguém com poder (Ronaldo e o empresário Marcus Buaiz marido da Wanessa
e pai da criança ofendida). Diziam que eles usaram sua influência para que Rafinha
fosse punido. Até credito que a punição realmente só aconteceu por causa disso.
Mais uma vez, um erro não justifica o outro e o fato dos ofendidos terem usado
o poder que têm não diminui a agressão e o absurdo desprezo pelas pessoas por
parte do humorista.
A culpa é da liberdade?
Opa, nunca. Na verdade vivemos em uma época esquisita. Depois de mais de 25 anos de volta à democracia, parecemos que somos ainda adolescentes na coisa. Quando nos expressamos, brincamos ou protestamos. Somos semelhantes a centroavantes de frente para o gol, sem goleiro, que com a liberdade de chutar pra onde quiser dentro das três balizas, mandamos a bola na arquibancada quando só um toquinho na bola é suficiente pra marcar o gol e cair nos braços da torcida.
Eu acredito na liberdade, mas creio que o trauma de ser
privado dela nos deixou meio sem parâmetros. A lembrança de não tê-la ainda nos
oprime, até quando nos achamos livres. Imagina
isso aliado ao quociente de egolatria de todo ser humano, somada a tendência
despótica mais aflorada em alguns, sejam eles políticos, esportistas,
humoristas e porquê não, blogueiros.
Ah, nós seres humanos...
Se você conseguiu chegar até o final sinta-se livre para
comentar, discordar, concordar, criticar ou não dizer nada (é um direito seu
também, mas vai ser mais legal se você falar, sério...)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Expresse-se aqui.