UM DESENHO POR SEMANA

sexta-feira, 2 de maio de 2014

O herói e a culpa nossa de cada século.


Ontem homenagens e mais homenagens foram feitas para ele. Esse texto não pretende ser mais uma. Mas perdoem-me se porventura soar como tal. Esse texto,na verdade nem é sobre ele, é sobre culpados. Aquela cena famosa. O piloto nos braços do povo. Como nenhum mártir pôde ser, como todo político gostaria de estar, mas só ele conseguiu. Pelo menos nos últimos trinta anos. Sempre achei exagero chamar alguém que nasceu em berço de ouro e nunca deu uma contribuição prática para um país cheio de mazelas, de herói. Sempre achei exagerado, dado que ele era meio Dick Vigarista quando queria. Sempre achei exagerado, dado que amamos falar mal das vitórias esportivas do futebol. Tratamo-as nos últmos tempos como o pior da alienação brasileira. Basta uma competição futebolística e alguém usar uma bandeira para as críticas surgirem - hoje não pode. Imagina na...enfim, você sabe. No Brasil cantar hino, achar a bandeira bonita é dado como coisa de militar ou fascista, ou de militar fascista. À época das manifestações de junho, li devaneios e teorias conspiratórias que prometiam um golpe de direita e que a maior dos sintomas era cantar o hino. Não nego que o uso do nacionalismo e ufanismo fizeram mal ao mundo a partir de países e grupos que o usaram. Mas aqui somos avessos a tudo. Trauma? Não sei, talvez. De qualquer forma, para alguns de nós brasileiros usar verde amarelo é sempre bobo. É apoiar, endossar o governo ou apoiar um golpe de direita derrubando o governo de esquerda. Ou seja, não importa o lado, vestir verde amarelo é ruim. Vivemos em um país onde é cool dizer que não há senso crítico, que todo os nossos heróis são falsos ou que tem um lado obscuro (como se os de todos os outros paises também não o fossem). Orgulhar-se de qualquer coisa nascida aqui parece ser de uma ingenuidade de dar pena. Preocupamo-nos com a o uso político de tudo. Fomos e ainda somos enganados constantemente. Estamos à flor da pele, entendo. Mas voltemos ao piloto naquele dia, com aquela vitória histórica, com a bandeira nas mãos e os braços do povo Mais do que no dia acho hoje que ele ali teve um ato heróico. Por que com ele nos permitíamos gostar do Brasil. Um feito inatingível materializado nos braços do povo. Tá, nos braços do povo exatamente não, a final aquela pequena amostra de brasileiros presente no autódromo não representava socio-economicamente o povo brasileiro. Mas o representava sim, sem a menor dúvida, no sentimento de qualquer habitante da terra brasilis que tinha uma TV, não importando a classe social.       Com o piloto a gente não tinha vergonha da bandeira. A gente não pensava no governo. Quando o carro recebia a bandeirada em primeiro lugar a  gente não achava que estava sendo ufanista. Pode me chamar de tolo, mas gosto de ficar feliz quando uma seleção qualquer vence. Gosto de esportes, gosto de assistir olimpíadas e cada luta de judô. Gosto do sentimento de alguém do meu país ganhar e mais, gosto da bandeira brasileira. Pra mim, reunir uma nação que o tempo todo tem vergonha de si mesma, em um sentimento de vitória coletiva é um ato notável. Naqueles domingos todos poderiam ter uma alegria em comum sem pensar que estavam sendo massa de manobra ou “enganado pela mídia”. Talvez naquela época, por não haver rede social, a gente não fosse chato, pré-conspiratório, dono da verdade. Dessa forma também não havia a facilidade da opinião raza e das teorias da conspiração pra compartilhar. Talvez seja isso. Talvez fôssemos mais infelizes e precisássemos de um desafogo. Ou ainda o jejum de copas nos fazia orfãos de vitórias esportivas e achamos guarida em uma bandeira tremulada no automobilismo. Não sei. Apenas me lembro com um sorriso no rosto, sem culpa. Ela, a culpa, é um dos piores sentimentos que se pode ter. A culpa no Brasil é um o outro lado da moeda que não gostamos de carregar, a falta de vergonha na cara. Todo o jeitinho, toda a corrupção desde 1500 pesa sobre  nossos ombros. Não nos damos o direito de gostar daqui. É como se não conseguíssemos andar para frente. Ficamos presos no cículo vicioso de reclamar e nada fazer. De falar mal dos políticos corruptos e pedir pra transferir pontos das multas. E assim, o jeito de não parecer ingênuo perante às mazelas é nos culparmos como nação. Carregamos o fardo de tudo de errado que como país fizemos e nossa redenção é o autoflagelo. E a culpa sentida e transferida, que é o que mais a gente vê todos os dias nas redes, nos poderes e no cartório. Não acho o piloto um herói nacional na acepção da palavra, mas sinto-o como se fosse um pessoal, pelo benefício de uma memória minha de poder gostar das cores da minha bandeira novamente.

Um comentário:

  1. Gosto da dinâmica dos seus textos, mas gosto, acima de tudo, de ver que você pensa fora da caixa. Parabéns e um abraço.

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