UM DESENHO POR SEMANA

quarta-feira, 30 de maio de 2007

Oqéisso, companheiro

O que é isso, companheiro,1997. O ano em que meus pais saíram de férias, 2006. Zuzu Angel, 2006, Batismo de sangue, 2007 e até o ruim A taça do mundo é nossa, 2003. Só para citar alguns. Um em cada três filmes brasileiros, desde a retomada do cinema nacional do fim dos anos 90 fala de ditadura. Perdoe-me pelo exagero. Parafraseando o Chico Buarque, a “página infeliz da nossa história” que poderia ser uma cicatriz pra nos lembrar do que devemos ter cuidado e nunca mais deixar acontecer, é tratado como ferida que tem que ser deixada aberta. Há um tempo atrás assistindo ao programa Provocações, o apresentador Antônio Abujamra comentava com a historiadora e professora da USP Maria Aparecida de Aquino, que certa vez conversando com estudantes da faculdade paulista, ouviu deles que a atual geração precisava de uma guerra. O ser-humano tem necessidade de uma peleja. É, desde sempre. Só uma guerrinha para tirar a monotonia. Quem já leu a tira “Hagar, o Terrível”, deve lembrar que a guerra para ele é o seu trabalho, o esporte, o lazer. Nós nascemos com essa coisa de lutar. Lutar pra viver, lutar pra não dormir, lutar para ter o que queremos. Quando não temos – ou achamos que não temos - o porquê de lutar, ficamos entediados, e o bom adágio nos vem à cabeça: “mente vazia...”
Vamos para 27 dias de invasão à reitoria da USP. A Unicamp passou por isso a pouco. É nesse contexto que surgem questões que muitos tentam responder, mas não há como fechar numa verdade, pura, unânime. Existem argumentos, existem opiniões, existem até fatos. Mas para mim a pergunta que vale é “por quê lutamos?”
É inerente à juventude o questionamento, o idealismo. Na mocidade é que há também a vitalidade suficiente para dar suporte a esses questionamentos. Grandes fatos de nossa época aconteceram através da força da juventude, de sua inquietação e inconformismo. São os adultos mais jovens que vão para guerra, são eles que desbravam novas tecnologias, que criam novas formas de arte, e que afinal, acreditam e lutam por mudanças.
Voltemos aos filmes citados no início. São relatos de uma época importante, que não pode ser esquecida. Se comparado ao cinema norte-americano, diria que é o nosso Vietnã, pela recorrência do tema nas telonas e pela relevância histórica. O que pega é a saudade da luta do tempo da ditadura que os jovens estudantes de universidades públicas parecem sentir. Ou pior, querem agir como os universitários da época dos anos de chumbo, só que em tempos de democracia. É no mínimo um desrespeito aos que passaram pela repressão.
Pneus, tapumes, hinos de protesto (hein?), representantes dos direitos humanos, sem falar em blogs e vídeos no youtube, parecem fazer parte de um esforço desproporcional da privilegiada juventude não apenas na busca de manter a autonomia da faculdades estaduais, mas sim de lutar por alguma coisa. Qualquer coisa. Abertura política, diretas, impeachment do ex-presidente Collor, já foram. E agora o que sobra para lutar? Os outros 90% da juventude brasileira citaria:
- trabalhar de madrugada para concluir uma universidade privada;
- pagar plano médico;
- comprar uma casa para os pais;
- pagar o próprio aluguel;
- esquecer dos estudos para ajudar em casa;
- fazer mestrado enquanto trabalha e sustenta os filhos;
- sair de uma casa onde todos são analfabetos e conseguir fazer ma faculdade;
- Lutar para sobreviver não às balas perdidas que chegam até os centros, mas para resistir à tentação de se juntar à bandidagem da qual é vizinha de barraco.
Entre muitas outras coisas.
É, a vontade de lutar supera a necessidade de um motivo. Lutar, rebelar-se contra o status quo. Ms desde que o staus quo não seja “eu”. Existem muitos motivos para lutar, mas talvez, sejam causas que não precisam de passeatas, pneus e tapumes. Talvez sejam causas que exijam um esquecimento do “eu” e uma lembrança do coletivo, até mesmo do público. O que talvez não ocorra tanto no caso citado, ao calcularmos o prejuízo causado aos cofres públicos, comparável a negociatas e esquemas de corrupção, tão vigentes em nosso país e condenados por todos.
Faz-se necessário parar de se valer de qualquer discurso panfletário, de camisetas de revolucionários, de discursos de astros mortos do rock dos anos 80. Largar os manuais de revolução por apenas 5 minutos e pensar nos outros. Talvez um dia a galera da invasão da reitoria ao invés de contar às próximas gerações que fez parte daquela ocupação na USP com orgulho, diga simplesmente:
“Filho, eu tava numa invasão uma vez. A gente estava certo, mas fez tudo errado”
Trilha sonora:
Núcleo Base (Ira!)

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