Uma indignação passiva não faz verão
por Kie Magalhães
Dos diversos
assuntos que povoaram a minha mente durante os últimos dias, quis o destino que
me caísse um tema cascudo. Complicado escrever sobre algo cuja motivação é tão
pessoal e ao mesmo tempo tão coletiva. Do momento em que
decidi aceitar o desafio proposto por um querido amigo, uma canção já esquecida
teimou em não sair da minha cabeça, mas permitiu uma rápida viagem no tempo.
Em meados de 1992,
período em que o conterrâneo grupo Skank embalava o movimento dos Caras-pintadas
com o hit In(Dig)Nação – que na verdade buscava criticar a nossa ausência de
consciência política – milhares de jovens foram às ruas protestar contra o
governo de Fernando Collor. Movidos pelo sentimento de repúdio aos absurdos e
sucessivos escândalos do então governo, no qual depositaram suas mais sinceras
esperanças de um país melhor, e inspirados em seus heróis que lutaram contra a
ditadura, nossos jovens fizeram história, mas saíram de cena logo após
cumprirem seu objetivo. Não é segredo que a despeito das manifestações e
todos os prejuízos que Collor significou para o país, ele tenha sido reeleito,
anos mais tarde como senador. É triste relembrar os versos da canção, enquanto
assistimos Renan Calheiros caminhar tranquilamente rumo à presidência do Senado.
No próximo carnaval, use uma fantasia de cidadão brasileiro, porque de palhaços, já estamos vestidos faz tempo.
É, ainda não atravessa. Nossa indignação se modernizou, ganhou as redes sociais, mas ainda não atravessa as telas de nossos smartphones e notebooks. Ironicamente, nenhuma tecnologia é capaz de materializar o nosso desejo de uma renovação política. Os políticos perderam a capacidade de se envergonhar? E nós perdemos a nossa capacidade de lutar? Não, nós não perdemos. Mas temo dizer que perdemos a capacidade de nos educar.
“Ah, mas o governo não nos oferece uma educação de qualidade!”, bradarão inflamados.
“A nossa indignação é uma mosca sem asas, não ultrapassa as janelas de nossas casas".Tento entender as diferenças desta geração que elege os mesmos corruptos que outras lutaram para banir da política e me perco nas minúcias e labirintos das leis do país. Entretanto, arrisco um palpite: nunca tivemos tanto acesso à informação e tão pouco interesse por ela. Parece-me que a informação hoje é aquela menina bonita que sorri pra gente e a gente não quer conquistar porque acha que ela está “dando mole”.
No próximo carnaval, use uma fantasia de cidadão brasileiro, porque de palhaços, já estamos vestidos faz tempo.
É, ainda não atravessa. Nossa indignação se modernizou, ganhou as redes sociais, mas ainda não atravessa as telas de nossos smartphones e notebooks. Ironicamente, nenhuma tecnologia é capaz de materializar o nosso desejo de uma renovação política. Os políticos perderam a capacidade de se envergonhar? E nós perdemos a nossa capacidade de lutar? Não, nós não perdemos. Mas temo dizer que perdemos a capacidade de nos educar.
“Ah, mas o governo não nos oferece uma educação de qualidade!”, bradarão inflamados.
Que geração é essa
que espera do governo uma educação de qualidade como quem espera a volta do
Messias? Se o governo não
oferece, o que fazer? Levantemos da cadeira! Deixemos de ser “anciosos” a
espera de um milagre. A espera do Carnaval, ou da Copa do Mundo vexatória que
estamos prestes a sediar.
Deixemos de ser
recém-formados alienados das políticas monetárias, das mazelas do mundo,
deixemos de ser analfabetos do nosso próprio idioma. Quando vamos deixar de nos
escandalizar somente com as grandes tragédias que serão varridas para o
esquecimento pelo novo corte de cabelo no Neymar, enquanto engolimos
pacificamente as tragédias cotidianas, como a falta de atendimento e
medicamentos nos hospitais, a morte de crianças vitimas da miséria do
desperdício de recursos?
Vamos continuar
bebendo uísque ou água de coco em um Brasil que tanto faz?
Kie Magalhães tem os dois pés na publicidade, o coração no jornalismo e a cabeça na lua. Acredita que toda escrita tem uma sonoridade musical e sempre que pode, arrisca umas notas..
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