UM DESENHO POR SEMANA

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

JE SUIS PORTA DOS FUNDOS

Há mais ou menos um ano não assisto ao maior fenômeno do youtube brasileiro. As pessoas compartilham, me indicam, mas eu não assisto. Tudo começou com um leve desencantamento depois de grandes esquetes, quando peguei a estrutura da maioria das piadas e percebi um pouco de repetição da mesma ideia, extrapolada para situações diferentes. Um dos grandes trunfos do canal era a surpresa, o nonsense, o diferente, e naquela altura eu já sabia o que ia acontecer após os primeiros 20 segundos do vídeo. Houve uma melhora pouco tempo depois, voltei a ver. Foi então que aconteceu.
Uma esquete sobre médicos que viam a imagem de Jesus na vagina de uma mulher. É.
O pior é que eu entendi a piada. Não era uma ofensa a Jesus, mas o escracho com o ver tudo  em qualquer lugar, a manipulação da crença, os delírios de ver personalidades no pão, na forma engordurada etc.Apesar de em tese não querer ofender a fé de ninguém, achei a piada fraca, desnecessária, infantil. A época, outra esquete havia ofendido alguns grupos e o que me pareceu foi que no afã de defender a liberdade criativa, fizeram algo mais chocante, e, sem graça. 

Não pensaram em quem acredita, em quem se sentiria ofendido. Que legal, não estavam nem aí. E se você se sentisse ofendido, você era um babaca, obtuso de direita a favor da censura. Outros comediantes alegaram que piada não pode machucar. Não? Se palavras ofendem, qual a razão de toda uma representação satírica não o fazer? Por outro lado, satirizar não é isso?Com essas questões na cabeça decidi parar de assistir. Para mim havia perdido a graça. Me soava triste aquela cena. Não fiquei nervoso, mas triste. Não por Cristo, que já havia sido ofendido, cuspido, açoitado aqui na terra e não precisa de defensores, mas pelo ignorar do outro, de como vai se entender aquilo. Não uma preocupação politicamente correta, com esse ou aquele grupo, mas com o indivíduo mesmo. Sei lá, cidadania pra mim também é um pouco isso, essa preocupação com invandir o espaço alheio, respeitar quem está do lado, mesmo que eu não veja. Isso é ainda mais esperado por quem tem tanto poder de alcance nas mãos. Por isso não merecem a minha audiência, tenho essa escolha. Mas por outro lado, também não mereciam uma jornada contra eles. Sim, eles tem o direito de falar o que quiserem, de satirizar o que quiserem. Sim! Essa liberdade assiste a todos nós. É essa liberdade que nos permite professar nossa crença, nossas ideologias, tentar propagar aquilo que nos é caro, sem a preocupação de ser calado, ou preso por nossas opiniões. Eles creem que tudo deve ser dito e que ninguém deve se ofender. Que o façam! E não sejam censurados, ou ameaçados como foram absurdamente em relação a uma piada feita com a polícia. Fácil é lutar pela sua liberdade de falar, ou uma causa distante. Difícil é o fazer pela liberdade de todos, mesmo aqueles que te ofendem.

No meio da tragédia se torna óbvio o apoio a quem foi ferido. Mas e se não o fossem?
É por isso que hoje não sou Charlie Hebdo. Pela garantia do seu direito de dizer o que quiser, mesmo que eu não goste,  pour la liberté, je suis Porta dos Fundos.

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