No último domingo Tom Brady e seus colegas de time sagraram-se campeões no superbowl. Após uma sequência de viradas e um bloqueio incrível na última jarda do ataque dos Seahawks, os Patriotas honraram seu nome e deram orgulho azul e vermelho para todos nós.
Toda essa introdução foi redigida sem eu ter assistido a um minuto se quer do jogo, ou até mesmo lido, procurado a resenha do espetáculo por aí. Tudo o que sei da partida foi montado dias antes e nas primeiras horas da segunda-feira, o dia seguinte do feito do marido de nosso orgulho nacional, Pelé (troca), Eike Baptista (troca), Romero Britto (troca), Paulo Coelho (troca), Gisele Bundchen.
Muito se falava disso. Em termos publicitários é o evento do ano (o engraçado é que estamos em fevereiro). São os segundos comerciais mais caros da TV mundial e eu, como redator, recebi de todas as minhas referências no twitter e no instagram, uma chuva de análises criativo-mercadológicas dos filmes que passariam nos intervalos do evento, bem como os números dos investimentos feitos. Sim, mas isso acontece todo ano.
Na verdade, uma mudança de comportamento que acontece a cada ano foi que me chamou a atenção: o aumento da quantidade de brasileiros engajados, não com o fator comercial, mas com uma dita paixão especificamente pelo New England. E para falar sobre isso estou muito confortável.
Há cerca de 20 anos comecei a assistir futebol americano. Na época, como a grande maioria dos brasileiros, na casa da minha mãe não tinha TV por assinatura e saber da existência do esporte passava por duas origens:
- A sessão da tarde com todas as comédias românticas de highschool e seus grupinhos de sempre - os nerds, os mais ou menos, os atletas e as cheerleaders, que invariavelmente eram as garotas populares, namoradas dos membros do time.
- Transmissão da NFL na Band, com narração de Luciano do Valle.
A primeira, me influenciava como tudo que vem dos EUA, como produto cultural, mas não acrescentava absolutamente nada em termos do que realmente era a modalidade esportiva em questão.
Foi a segunda origem que me ensinou a respeitar o esporte. Como havia feito com o voleibol, a NBA e posteriormente a Fórmula Indy, o Sr. do Valle trazia mais um esporte distante da realidade dos brasileiros, abordando-o como cultura, como modalidade que merecia ser vista. Em suas transmissões, Luciano era didático. Foi com ele que entendi o que era uma jarda, que eram necessárias dez para alcançar o primeiro down, que um time só atacava e outro só defendia, que o quarterback era o 10 do time, que o receivers eram os centroavantes que precisavam estar no lugar certo, na hora certa, que os wide receivers eram como pontas-de-lança, e que os zagueiros eram, bem, zagueiros. Aprendi que cada equipe tem dois times, um que defende e outro que ataca. Aprendi o mais importante, a analogia do jogo: o campo de batalha. Entendi um pouco melhor o fascínio que aquele país tem pelo esporte. Entendi também muitas das relações daqueles filmes pueris que passavam às tardes na emissora dos Marinho.
É nesse ponto que me encontro comigo mesmo nos dias atuais vendo com estranhamento o fascínio de alguns brasileiros por determinado time hoje. Ainda que eu entenda e aprecie o jogo, respeite a qualidade pirotécnica do espetáculo e saiba de sua relevância comercial, me assusta um pouco esse envolvimento todo. Sim, amigos, cada um se diverte e admira o que quiser! Mas confesso que eu, palmeirense de nascimento, prefiro ver um #vaicurintia a um #gopats na timeline. A paixão por times geralmente vem de uma identificação que passa pela relação cultural ou familiar, demográfica, social ou ainda de prática do esporte. Aí ao ver pessoas se preparando para ver o jogo, ansiosas, uniformizadas, e eu lá sem entender, comecei a analisar os possíveis motivos.
1. Você é esposa do Tom Brady
Não, acho que você não é. Próxima.
2. A culpa é do nosso futebol
É a primeira coisa que vem à mente. Corrupção, campeonatos mal elaborados, times fracos, os melhores jogadores fora do país, monopólio de transmissão e a quase impossível tarefa de escalar um time titular na cabeça como se fazia há 30 anos. Sabe a tal da falta de amor à camisa que se diz por aí? Não é um fenômeno que atinge só os jogadores. Os novos torcedores pelo jeito também perderam o sentimento apaixonado.
Meu sobrinho de 8 anos sonha em jogar no Real Madrid, no Paris Saint Germain ou no Chelsea. Nunca pensou em defender a seleção ou jogar em qualquer time daqui.
3. É natural, agora temos acesso fácil a tudo que vem de fora.
Na época do Luciano não tínhamos acesso a 2% do conteúdo que temos hoje. Além do aumento de residências com TV por assinatura, são 22,8 milhões segundo a Anatel, passamos de uma internet incipiente para uma nuvem de informações que estão a nossa volta o tempo todo. Não existem fronteiras, como as operadoras de telefonia gostam de dizer. Hoje o produto cultural seja ele em forma de música, filme ou mesmo esporte está a mão pra quase qualquer um, na hora em que se deseja.
4. American way of life
Eita, mas esse papo é antigo, hein? Opa se é, tem pelo menos 85 anos. A admiração pelo modo de vida americano, somado ao momento de baixa auto-estima da população tupiniquim pode ser uma explicação. O sonho dourado de boa parte dos brasileiros médios (expressão perigosa) é viver como nos Estados Unidos. Não como na Dinamarca, Alemanha, ou Austrália, mas como na terra do Tio Sam. Quando se compara o poder de compra das moedas, os impostos pagos e as burocracias, o padrão é sempre os EUA. Durante as eleições, se a atual presidente ganhasse, meio Brasil iria morar em Orlando. Ninguém foi, mas sempre tem as férias pra dar aquela passeada marota na Disney e trazer muamba gourmet, quer dizer, cool, high level, VIP. Só lembrando, o time chama Patriots e o mascote é um soldado lembrando a independência do Bras...quer dizer, dos Estados Unidos da América.
5. Redes sociais e o desejo de diferenciação dos demais
(contribuição no argumento por Felipe Coelho)
Ah, o glamour das fotos, o prazer em compartilhar, o frenesi de se ver melhor. Aceitamos ser amigos de centenas de pessoas para nos mostrarmos diferentes ou melhores que elas. Tá, eu e você não fazemos isso, a final somos diferentes (opa). É como quem cita aquela banda que ninguém conhece, ou a frase filósofica daquele autor que vai te fazer parecer inteligente. Pense comigo: torcer apaixonadamente para um time que fica numa cidade de um país que não é o seu, de um esporte que você nunca praticou, com o qual você não tem uma história ou relação. Se o incipiente torcedor brasileiro que se uniformiza e comemora um título como se fosse dele, não tiver pelo menos 3 das características acima, o desejo de status e diferenciação pode ser um deles.
Tá, mas e os Patriots com isso?
Eles ganham com a globalização do nome e o consumo da marca. Da mesma forma a NFL (National Football League) e os EUA. O horário da TV fica cada vez mais caro, já que os anunciantes tem mais e mais público assistindo seus comerciais, os shows ficam ainda mais inacreditáveis e o ciclo só se fortalece.
Tá, mas e você com isso?
Eu? Eu nada. Cada um se identifica com o que acha que tem a ver consigo. Se conhecendo o futebol americano há 20 anos, com toda a influência hollywoodiana não me apaixonei por nenhum um time, não será agora que isso vai acontecer.Talvez o que escrevi aqui não explique essa paixão repentina de alguns brasileiros.Talvez apenas esteja muito velho pra me apaixonar por um time de futebol americano. Eu estou com a reles maioria, o time para o qual eu torço ainda troca as mãos pelos pés.
Muito bom!
ResponderExcluirO legal te torcer por um desses times (NBA, NFL), é que se o seu time perder, amanhã estará tudo bem.
Paolla Oliveira assumiu o posto da Gisele. Rsrsrs.
Ah, GO COWBOYS!